Translation in Portuguese of Free Cooperation Intro

O trecho a seguir é o prefácio do livro The Art of Free Cooperation, e nos fornece uma série de insights preliminares sobre a livre cooperação (e também sobre o que NÃO É livre cooperação).

Colaboração em cima do muro
Editado por Geert Lovink e Trebor Scholz
Traduzido por Rafael Reinehr para Coolmeia, Ideias em Cooperação

A vida desabrocha com colaboração. Você pode fugir dela, mas não pode evitá-la. Ela lhe acompanha. A química entre vocês a coloca em movimento. O ciclo continua. E após um intenso período do coração, as coisas retornam ao normal. A novidade evanesce. Existe um descanso, uma perda de interesse. Uma amizade emerge. O trabalho está feito. Você segue adiante e esquece dos comuns ruídos de comunicação, das brigas, das egotrips desrespeitosas, ou pior: dos silêncios beligerantes.

Neste livro nós refletimos a dinâmica da colaboração (online). Nós não podemos meramente exaltá-lo como se fosse um produto – ou desconstrui-lo como se fosse mais uma ideologia (que ele é). O que estamos buscando não é nada menos ambicioso do que leis, mecanismos subjacentes, experiências comuns que podem ser cozinhadas e reduzidas a memes, recomendações e ditados fortes e perenes, que continuarão conosco por anos à frente. Nós propomos um laboratório de pensamento e experimentação para as futuras formas de colaboração! Nós não fazemos coro aos analistas de negócios que buscam na colaboração uma ferramenta para enriquecer aos que já são ricos! Nós de forma pungente damos suporte a atividades culturais auto-organizadas bem como ao uso de tecnologias de cooperação. O problema com este tópico é que até agora aprendemos tão pouco no que diz respeito a interações sociais avançadas. O conhecimento da colaboração não é de tipo passivo, um que você possa adquirir e então aplicar. A questão não é: como eu me encaixo? Nós somos apenas humanos uma vez, e estamos destinados a falhar. A despeito disso, com um gosto pela auto-reflexão podemos evoluir. Com a ascensão do individualismo, a colaboração se torna cada vez mais algo que percebemos como “voluntário”, quase como um artigo de comércio que podemos comprar. Uns podem presenciar uma curiosidade crescente, como se fosse um ritual esquecido, antigo, ou uma experiência exótica. “Colaboração? Parece interessante. Posso testar? Por favor faça – estamos oferecendo 30 dias grátis para provar”.

Um aspecto que chamou nossa atenção foi a parcial falta de – e o desejo de – participação. Projetos cooperativos são cada vez mais investigados como uma forma de motivar os muitos online a contribuirem. A questão aqui é distinguir entre um trabalho de equipe de cima para baixo em um escritório e sua retórica de gerenciamento. Nesse contexto, Christopher Spehr lança seu conceito de “livre cooperação”. “Por favor esvazie seu cinzeiro no lixo – obrigado por sua cooperação” não é “livre cooperação”. É um fascismo amigável, como Bertram Gross o colocou. Entre “livre e independente” e “forçado” existe uma crescente zona cinzenta de projetos, aplicações e práticas que não focam em ganhos de produção. E elas não são totalmente autônomas e renegadas. Não existe uma “inocência completamente branquinha”. Todos temos sujeira institucional sob nossas unhas. Não existe autonomia total em projetos colaborativos. Trabalhar em conjunto não nos exime de cumplicidade sistêmica. A ganância, inimigo auto-engrandecedor está dentro de cada um de nós. A conferência da Livre Cooperação, organizada em Buffalo em Abril de 2004, coloca estes problemas controversos na mesa.

No crescente hype da colaboração, a “economia alternativa” é sub-examinada até agora. Se nós sabemos que podemos conseguir um software, música ou livro gratuitamente através de nossa rede social, porque iriamos nos incomodar em comprar? Por que pagar pela Enciclopédia Britânica se a Wikipedia é uma oferta comparável e ainda por cima gratuita? Estamos dispostos a viver com (e trabalhar nos) muitos problemas desta enciclopédia gratuita. Nós não deixamos cair lágrimas por aqueles editores anglo-saxões brancos e protestantes fumadores de cachimbo da Britânica! Até que extensão os repositórios de conteúdo criado coletivamente  podem desafiar ou se equiparar à hegemonia do conteúdo das instituições tradicionais? Howard Rheingold descreve como coletivos de conhecimento caçam e coletam informação. Essas colaborações acumulativas inspiram. Elas também incitam os tubarões corporativos que querem afundar seus dentes em todos estes silos de conteúdo centralizados criados pelos usuários. Eles também amam toda aquela criatividade distribuída, todos aqueles geeks que deixam traços de suas ideias em blogs e wikis. O maior questão sobre essas práticas é o fato de que quantidades massivas de conhecimento é movido para o “comum não regulado” (Benkler). Aqui ele está livre e disponível a aqueles que tem uma conexão à internet, e a literacia online necessária. Aqui, estes arquivos vivem em um solo diferente. Em sua maior parte, eles podem ser modificados ou criativamente aprimorados. Frequentemente este conteúdo não pode ser transformado em bem de consumo. Mas se essas licenças realmente irão permanecer legais ainda estamos para ver. As questões de propriedade sobre práticas colaborativas em relação a bens comuns são muito importantes. São uma questão mais complexa do que o esquema tradicional de um autor vendendo ao Sistema. Nós poderíamos, por exemplo, afirmar que é o Google Incorporated que suga o lucro de milhares de wikipedianos não-pagos. Igualmente pode se dizer que os coordenadores de desenvolvedores de softwares livres são  transformados em figuras financeiramente dependentes dos jovens czares do Google.

O capitalista de risco David Hornik, enqaunto estudava planos de negócios de incontáveis pequenas empresas da assim chamada “Cauda Longa”, conclui que não existe dinheiro a ser feito com conteúdo na Internet. Desistam de suas esperanças, todos vocês que entraram aqui. Durante o período da corrida do ouro do oeste americano, não foram os garimpeiros de cabeça áspera que fizeram dinheiro. Existiam poucas pepitas do precioso metal dourado para serem encontradas. O dinheiro chegou a aqueles que serviram cerveja e alimentaram os garimpeiros. Na Internet de hoje não são os criadores do conteúdo que ganham o dinheiro. Os prospectos financeiros estão em agregadores e filtros. Escutem a análise de David Hornik:

“Os agregadores são aqueles negócios na web que buscam coletar tanto conteúdo da Cauda Longa quanto possível, de modo a fazer com que suas “lojas” uma parada única para o conteúdo não importa quão popular ou obscuro. O valor para os consumidores desses agregadores de conteúdo é que eles não precisam parar em dúzias de lugares na web de forma a adquirir um conjunto diverso de conteúdo. Como resultado, agregadores são aptos a extrair uma quantidade desproporcional de valor pela venda de cada pedaço individual de conteúdo. E enquanto os criadores provavelmente estão predispostos a vender um pouco mais de conteúdo como resultado da facilidade de venda, eles provavelmente não irão emergir da obscuridade da Cauda meramente porque foram colocados à disposição para venda no Amazon ou iTunes. Os filtros são aqueles negócios que tornam mais fácil encontrar conteúdo que nós achamos interessante, apesar da grande proliferação de criadores de conteúdo, hospedeiros, agregadores, etc. A forma mais pura de um filtro é a ferramenta de busca. Mas quanto mais obscuro um conteúdo, mais inefetica a ferramenta de busca generalizada será. Enquanto diferentes tecnologias de filtro podem fazer com que o usuário final encontre sua forma de achar um pedaço de conteúdo obscuro, ela provavelmente não será suficiente para catapultar um artista ao mainstream. Os beneficiários do filtro são  o usuário final e o próprio filtro, não o conteúdo em si.

“Amadorização em massa”, como promovida por Lawrence Lessig, Joi Ito e incontáveis outros cyberlibertários, é uma ideologia poderosa que agrada a um amplo espectro de pessoas. É um meme que foi desenhado para dar um volta positica no quadro depressivo que Hornik pintou. Os milhares de contribuidores voluntários à Wikipedia simplesmente deixaram de colaborar com esforços comerciais. Então qual é o problema com a “democracia extrema” (Ratcliffe/Lebowsky) em um tempo em que existe apenas perda das liberdades individuais, decepção em massa e confusão? Para responder a isso precisamos transcender as boas intenções e olhar para as implicações econômicas a longo prazo desta ideologia-do-livre-e-do-grátis. Cooperação sustentada, é claro, objetiva “profissionalização em massa”. As pessoas adoram fazer a vida com um trabalho que eles amam e que lhes permita abandonar seus McTrabalhos. Não existe nada romântico sobre os trabalhadores pobres. A questão se torna então como, juntos, podemos reverter a lógica cínica dos Horniks e Itos que continuam a definir as regras do trabalho na Internet.

Este livro não é sobre as conferências realizadas no evento Livre Cooperação. Também não é um ensaio-maratona de um único autor (o teórico alemão Christoph Spehr). Após o evento em Búfalo nós decidimos que era crucial para as discussões posteriores ter o ensaio “Livre Cooperação” traduzido para o inglês. O ensaio projetou uma série de respostas na comunidade que fala a língua alemã. Nós adicionamos material que achamos relevante à conversação. As perspectivas tecnológicas e artísticas particularmente nos fascinaram. Para a teoria de Spehr não é essencial cavar profundamente nas diferenças entre colaboração na “vida real” e “virtual”. Cada uma delas tem seus méritos. É estrategicamente importante não ficar travado em debates sem fim sobre a superioridade inerente das colaborações “reais” comparadas aquelas online (e vice-versa).

O que há de tão profundamente Velho-Europeu sobre a abordagem aqui é a paixão pelo pensamento negativo! Nós não estamos deprimidos! Mas nós estamos convencidos que podemos aprender a partir dos erros cometidos! Não é o germânico “Nem pense em tentar!” nem o americano “Entusiasticamente tente tudo, por mais sem sentido que possa parecer”. Nós propomos estudar de perto colaborações que não deram certo. Vamos lembrá-las. Vamos reconstruir seus trabalhos sociais, ao invés de novamente reconstruir a ideologia da harmonia e apenas focar nos inícios excitantes. O fator sentir-se bem do sucesso é atraente a todos nós. Mas ele também reprime os conflitos reais existentes e não solucionados. Nós sabemos que eles irão inapropriadamente explodir a qualquer momento se não os abordarmos adequadamente. Este é um chamado para mais pesquisa sobre “estudos de cooperação”. Quanto mais ferramentas sociais online se tornarem disponíveis e forem utilizadas, em uma escala massiva no mundo inteiro, mais materiais poderemos estudar, e mais urgentes os desfechos se tornarão. Este trabalho deve ser feito em um nível crítico-conceitual, com estudos de caso adicionais. Nós podemos integrar todas nossas percepções colaborativas no estudo de situações de conflitos (online). Isso pode parecer mundano. Mas considere isso: Quantos artistas colaboram ao fazer um trabalho (quase todos)? Quão visível é esta aliança no trabalho artístico (quase nenhuma)? Quanto sabemos sobre o processo de trabalhar em conjunto (perto de nada)?

Artistas contratam programadores e os pagam. Isso torna o trabalho uma colaboração? Deve o nome do programador aparecer nos créditos? Quem esconde a maioria do capital social por “colaborativamente” colocar seu nome em tantos projetos quanto possível? Como essa economia de reputação elusiva se traduz em dinheiro vivo? Vamos tirar estas e outras questões debaixo do tapete! Vamos discuti-las.

Nossa atitude em relação à colaboração, conflituada por referências da Segunda Guerra Mundial quanto ao próprio termo (pense: colaborar com os Nazistas invasores), é uma atitude cautelosa. Este texto pode soar a alguns como uma exaltação comunista da colaboração, mesmo mencionadas todas as desvantagens. Mas estamos genuinamente em cima do muro em relação ao assunto. Colaboração sempre aconteceu, forçada ou não, tensa ou agradável, causando dor de barriga ou calorões. Colaboração pode se referir a discussões românticas em torno da fogueira do acampamento utópico. Céticos vêem fracasso e auto-sacrifício no centro de cada e de toda colaboração. Eles são cegos à ecologia da colaboração. A substância de um esforço colaborativo “falho” frequentemente se torna a fundação para um novo projeto. Nós vislumbramos isso na comunidade código-livre, na qual um código algumas vezes é reciclado e, é claro, compartilhado. No mesmo contexto de desenvolvimento de código-livrea estratégia de compartilhamento olho-por-olho foi desenvolvida. Este método de troca por códigos foi baseado na reciprocidade. Bits de código são trocados por código de sua contraparte.

Românticos exaltam a colaboração. Eles pensam que ela deva ser como um caso amoroso. Pragmáticos ferozes, por outro lado, apenas cantam suas listas de “coisas a fazer”. Eles pensam que podem forçar um sorriso genuíno nos rostos dos “jogadores da equipe”. Essa aplicação mecânica das regras não funciona! Uma colaboração pode ser até mesmo parecido com uma paquera ou uma nova amizade. Ela pode ser um encontro muito satisfatório. Mas não existe receita para realizar esse encontro fantástico! É um evento! Você não pode agendar tal circunstância para as 11 horas da manhã, seguido de um almoço de negócios. O evento da colaboração verdadeira te leva para um lugar ao qual você nunca foi. Faz você esquecer do tempo. Em outros momentos, a colaboração se desenvolve rapidamente quando confiança é construída. Isso necessita de tempo. Interesses pessoais e profissionais precisam ser afinados. Estes envolvem vontade em participar e ser capaz de colocar algumas horas no projeto. Pode ser um chamado pesado se você está entre os muitos trabalhadores de classe baixa. É cansativo se você trabalha em três empregos para manter sua cabeça acima da água. Também é sinistro se você trabalha em dez milhões de projetos ao mesmo tempo. Colaboração pede por concentração. Colaboração online pode ter um sabor amargo para quem pensa que é apenas pura de tempo. Trocas de e-mails infinitas, chats ruidosos, diferenças de fuso horário fatigantes, softwares moribundos ou incompatíveis e uma banda larga instável são parte deste quadro nada convidativo. E não para aqui. O caráter exploratório, “precário” do trabalho imaterial em rede se adiciona a este cenário horrendo.

Existe, sem dúvidas, uma coisa como uma “belas artes da colaboração”. Nós acreditamos que ela possa ser ensinada! É possível trocar experiências e reflexões e teorizá-las. Entretanto, frequentemente estas proposições são prescritivas. Elas terminam em um procedimento que você supostamente deve seguir. Colaboração é a ciência das listas! Os “faça” e “não faça” podem ser lidos como regras normativas. Mas também podemos interpretá-los como recomendações frouxas. Um pouco como caminhar em um terreno acidentado com um compasso e uma bússola mas sem um GPS. Você aproxima a direção. Colaboração é frequentemente um assunto controverso. Não é uma auto-estrada para o céu. Está misturada confusamente com  desejos humanos por reconhecimento. Ela grita por atenção em um momento no qual você está justamente tão atarefado com outras questões. É como considerar ter um filho – nunca parece a hora certa. A questão do trabalho oculto torna-se uma grande questão na colaboração. Muito frequentemente todo crédito é dado ao indivíduo mais visível em uma colaboração. Isto traz os projetos ao seu ponto de quebra. Dinâmicas de grupo são parte e parcela neste contexto. Talvez esta seja a razão pela qual crescentemente olhamos para sociólogos para liderar o caminho. Outro tópico importante em colaboração é a liderança. Nós pensamos que sempre existem hierarquias e regras nas colaborações. Sua existência precisa ser admitida e os capitãos da diretoria devem ser compelidos a rodar seu cargo.

O termo espontâneo frequentemente vem à tona quando falamos sobre estar junto online, mesmo neste texto, quando notamos que a colaboração não pode ser planejada. Mas a colaboração incrementada pela web dificilmente é espontanea. Ela é lenta. Entretanto, ela pode ser acelerada por encontros ao vivo, em pessoa. “Incorporada”, ela se torna geralmente uma mão cheia de pessoas que se reúnem. Online, mortais se encontram aos milhares. Colaborações na internet se tornam mais intensivas se os colaboradores vivem em proximidade e usam a comunicação baseada na web para adicionar aos seus encontros locais regulares. Uma pesquisa de Barry Wellman da Universidade de Toronto mostrou que mais e-mails eram trocados entre as pessoas quando estas viviam fisicamente próximas. Ele chama essas ferramentas de “software situado”. O qualquer lugar e o lugar nenhum da internet é desafiado por softwares locais-específicos que atendem uma comunidade ou localização particular.

Na Internet, ninguém sabe que você é uma multitude. Esforços comuns precisam ser tornados visíveis. Então, qual é o estado da arte no que concerne ao “Mídia-Ativismo”? Uma coisa é certa: movimentos sociais não emergem da Web. Seus começos estão em algum outro lugar, não no ato da comunicação online. A tecnologia ajuda nossas transações. Nós construímos ferramentas sociais e elas, por sua vez, nos constróem. Nossa linguagem muda através da tecnologia que facilita sua transmissão. A forma com que aprendemos muda. A forma com que aprendemos muda a forma que transmitimos e distribuímos. O jornalismo cidadão cresceu em números desde a emergência da Indymedia durante as demonstrações de Seattle contra a OMC em 1999. Mas demonstrações como a de 15 de fevereiro de 2003 contra a Guerra do Iraque correram mais por conta da voz nas ruas do que através de protocolos da world wide web.

Existe atualmente uma onda de colaboração e redes sociais. Elas são infladas e publicizadas a uma extensão que nos traz problemas. 2004 foi declarado o ano dos blogs. Os milhões online estão tentando encontrar para si mesmos o que eles querem perguntar à web. São blogs não mais do que despejos diários para a dor dos adolescentes? Ou são uma nova plataforma para os intelectuais que teriam feito Jürgen Habermas e também Alexander Kluge repensar a esfera pública? Novas plataformas tem diferentes configurações de públicos assistindo e contribuindo. Em 2005 os filtros colaborativos, as ferramentas de bookmarking social e a taxonomia das pessoas (folksonomia) despontaram. Ao contrário do que se pudesse pensar, estes softwares socializantes tornaram algumas pessoas autistas. Elas foram apenas inundadas por tantas informações. Toda essa blogagem, leitura de feeds RSS e e-mails não as deixou TEMPO para pensar (por elas mesmas). Nós filtramos e então passamos a ser o que filtramos!

Para o analista de negócios Chris Shipley a colaboração online se inclina para comunicações em redes sociais através de sistemas avançados de e-mails com compartilhamento de endereços ou acesso comum a um banco de dados. Em seu ensaio de 2006 “O Ano em que Trabalhamos Juntos!” ela nos lembra de configurações colaborativas recentes como redes de amigos de amigos tal como Friendsters. Shipley argumenta que estas formas de trabalhar junto não realmente as qualifica como colaboração. O simples atirar e coletar coisas ou dados de uma caixa constitui colaboração? Colaboração é uma coisa arriscada, interconectada. É um caso intensivo no qual indivíduos que são parte de um grupo compartilham um mesmo objetivo. Eles dividem os benefícios e as perdas. Cooperação, segundo ela, é um caso em que participantes independentes avançam separadamente. (?) E finalmente, consultoria é o modelo mais frouxo de trabalho em conjunto.

Em breve iremos ver colaborações mais genuínas. Hoje, criamos quantidades massivas de conteúdo online. Nós não apenas customizamos e usamos e compramos coisas online. Nós colocamos ali nossos recursos e pensamentos e sentimento. A cultura do livre compartilhamento floresce. Mas ainda as mentalidades em direção ao compartilhamento variam amplamente. Alguns se dão conta de que se beneficiam por dar e compartilhar tudo. Outra ainda se sentem ameaçados por esta abertura. Eles preferem segurar as coisas próximas do seu peito já que temem perder algo em meio à confusão de trocas. A criatividade está geograficamente distribuída. Nós somos produtores. Nós somos autores. Nós somos colunistas e instigadores. Nós damos suporte a outros e somos ajudados em troca. As pessoas estão se tornando acostumadas com as ferramentas e softwares sociais. Elas fazem usos inesperados delas. “Bumplist” do pesquisador e artista Jonah Brucker Cohen é um bom exemplo. Nela, apenas um limitado número de participantes pode assinar uma lista de e-mails em um dado momento. Uma vez que novos contribuidores entram, os membros antigos que excedem o limite da lista são “jogados fora”.

Ferramentas online criativas, participatórias fazem sucesso nas artes. Isso é verdade ao menos quando se trata de colaboração e cooperação. Artistas configuram contextos sociais aos quais outros possam contribuir. Existe uma longa história de participação na arte, como visto em ensaios feitos por Dieter Daniels e Inke Arns. Eles apontam para uma trajetória que começou no início dos anos sessenta e que segue até hoje. Eles incluem Duchamp, Kaprow, Cage e Lyotard (Les Immateriaux). Nós vemos muitos destes projetos de desenho colaborativo surgirem online. O projeto de arte online fechado, estático, saiu do gosto das pessoas.

Colaborações no mundo da arte frequentemente acontecem em um estágio precoce na vida dos artistas, após a graduação no ensino médio. Aqui, coalisões que tornam a entrada no mundo das artes mais fácil são construídas.

O segundo modelo de colaboração é daqueles que saíram do mundo da arte e buscam plataformas alternativas para exposição e diálogo. Colaborações de nível inferior como consultorias é o pão e água do dia-a-dia dos tecnólogos. Artistas trabalhando com tecnologias necessitam trabalhar com programadores já que, em geral, nenhuma pessoa consegue saber tudo o que é necessário para finalizar um projeto. Enquanto o número de descrentes no modelo da estrela solitária está em declínio, a ideia do artista genial continua vívida. Colaboração não é para todos! E ela pode ser abusada! Enganadores colaborativos frequentemente inflam seu próprio capital ao não creditar seus ajudantes. Colaborações entre artistas e cientistas também não são uma ocorrência nova. Nesses cenários de trabalho estão mais frequentemente no papel de ilustradores. Eles visualizam os resultados dos cientistas e então ajudam a comunicar seus achados para o público. Mas diferentes linguagem profissionais e talvez diferentes aprendizados políticos podem correr contra esta parceria. Precisam artistas e cientistas ter o mesmo objetivo para trabalharem juntos? É necessário um longo tempo para estabelecer uma conexão verdadeira entre artistas e cientistas que leve a resultados consequentes.

Também na educação a colaboração está em ascensão. Isso pode soar improvável. Estudantes são negociadores igualitários na hierarquia da sala de aula. Mas seu poder de barganha e capacidade de sair de uma cooperação forçada é limitada. Salas na maior parte das escolas de arte mal acomodam o grupo de trabalho. Somente as universidades mais iluminadas permitem trabalhos colaborativos. E a cultura do compartilhamento não está bem alinhada com a corporatização da academia. Aos professores ainda é negada a garantia de estabilidade pelo fato dos mesmos apostarem no trabalho colaborativo. Mas o compartilhamento cresce em face da escassez de recursos. O Projeto Conexões, da Universidade de Rice, é um exemplo. Este projeto permite a grupos de professores e estudantes a criar em conjunto programas de aulas a partir de módulos de conhecimento. O MIT Open Courseware compartilha os programas de cursos ensinados na universidade. Pesquisadores pelo mundo usam a ferramenta de compartilhamento de bibliografias Citeulike. Em adição, existe a ideia de programação intensiva. Aqui, pares de dois aprendem a programar em conjunto. Todos estes projetos são baseados na ideia de colaboração e compartilhamento de recursos. Mas compartilhamento vem com o custo do dar-receber. Hierarquias de trocas são estabelecidas no momento em que um presente muda de mãos: “muitidade” hegemônica (Fuller). Você precisa ser recíproco ou você está “despresenteado”. Quanto maior o presente, maior o presenteador. O MIT se beneficia financeiramente por seu compartilhamento de programas. Ele se reinscreve entre os líderes do mercado e assim atrae estudantes e professores.

A maior magnitude de participação acontece em ambientes colaborativos online que focam em questões relacionadas à saúde. As pessoas aderem a grupos de suporte e comunidades virtuais relacionadas à saúde para discutir sua doença e as deixam quando ela é resolvida. As pessoas podem conversar com outras que estão passando pela mesma coisa. (Seu médico provavelmente nunca passou ele mesmo pela doença que você tem). Nestes fóruns, as pessoas se dão conta que não estão sozinhas com seu problema.

Quer seja online ou na vida cívica, o padrão é a não-participação e o desengajamento. Robert Putnam mostra isso muito bem em seu trabalho. Os exemplos de Putnam como ir à Igreja são algo antiquados. Entretanto, seu argumento básico vai ao ponto e não está em contradição ao que estamos focando aqui. Mesmo com o crescimento de blogs e wikis, a participação cívica offline (e desta feita a colaboração) está em declínio. A despeito disso, números cada vez maiores de pessoas se unem a situações de trabalho colaborativas possibilitadas pela web.

O contexto da Internet permite os mais altos graus de filtragem para conectar pessoas com pensamentos similares. No ambiente seguro e anônimo da Internet, as pessoas não precisam nem ao menos arguir com opiniões opostas. Sem mais confrontações face a face. Online você pode ser seletivo e as questões raciais desaparecem do seu radar. A inequidade econômica desaparece da sua vista. Visões políticas conflitantes evanescem. Isso leva a ilhas de consenso isoladas em torno de interesses específicos. Putnam, por exemplo, reporta que, em uma sala de chat sobre um modelo em particular do automóvel BMW, seus comentários sobre BMWs em geral foram tidos como “off-topic”.

O que torna a colaboração online tão atrativa? Essencialmente, colaboradores podem encontrar membros dispersos para suas equipes que possuem o conjunto de habilidades que seus projetos demandam. Por outro lado, críticos são rápidos em condenar a rede de servidão de trabalho imaterial que transformou trabalhadores dispersos em oportunistas-de-laptop que estão prontos a trabalhar em qualquer hora em qualquer lugar. A sociedade em rede permite ao capital se infiltrar em cada minuto de nossos dias. Não existe lugar que não possa se tornar um espaço de trabalho colaborativo. Tempo sem trabalho se tornou o tempo para o download. Seguros-saúde e pensões não precisam ser pagas para o que Howard Rheingold chama de trabalhadores “parte-da-solução”. Trabalho e lazer misturam-se um ao outro. Computadores pervadem todos os cantos de nossa existência. O lobo da exploração em rede necessita ser reconhecido quando aparece em pele de cordeiro ou na forma de pequenos e brilhantes gadgets.

Preparar para a colaboração. É tudo que podemos fazer. Não podemos predizer quando ela vai ocorrer. Ao melhor, inspiração energizante cresce no meio de um grupo. Nós não acordamos, tomamos café, e então colaboramos. Nós temos que adquirir uma série de ferramentas, aprender a arte da colaboração para que então possamos aplicá-la quando for necessário. Rheingold define esta habilidade de tomar parte em redes sociais aprimoradas pela tecnologia de uma capacidade chave para a próxima década. Nós a tentamos uma e mais uma, e outra vez, convencidos de que a soma de todas as partes é maior do que uma de suas partes. Colaboração floresce quando membros de uma equipe são experientes nestas situações. Ela necessita de confiança. Ela necessita tempo. Escala também importa. Como um pequeno time expande seus interesses com sucesso?

Nós, aqui, declaramos Darwin morto. História, interações humanas e comunicação não são feitas apenas através da sobrevivência do mais adaptado! Nós não compramos esta ideia nem por um segundo. O tópico da colaboração também está relacionado a Adam Smith e a estranha trajetória que suspeita que as coisas são feitas através da competição. Nós preferimos seguir a concepção de Piotr Kropotkin acerca do apoio mútuo. Kropotkin afirmou que as noções de Darwin eram limitadas e que a evolução era dependente de um suporte mútuo. Nós sugerimos uma crítica radical da competitividade! E apesar de todos os interesses corporativos suspeitos neste tópico, nós perguntamos se nós não progredimos mais ricamente através da cooperação livre.

Geração após geração, existem experiências feitas dentro de coletivos, grupos, empresas e movimentos. Como você escreve uma narrativa de eventos de ações coletivas? Como você captura a complexidade de produções coletivas? Isso é raramente capturado e teorizado, deixado só pronto para ser transferido em outros contextos sociais. A Teoria do Ator-Rede apenas nos leva até este ponto. Grammar of the Multitude, de Paolo Virno, vai um paço em direção a encontrar um nome para novas, temporárias alianças. Vamos colocar nossos ouvidos na base das colaborações. Uma surpreendente maioria das teorias da colaboração são escritas em suporte das amazon.coms deste mundo. Teóricos pensam através de coordenação de grupos, e construção de consenso – todos buscando “ter as coisas resolvidas”. O termo chave é “efetividade”. Nós perguntamos se esses conglomerados de negócios realmente necessitam de nossa ajuda. Será o software social o equivalente contemporâneo da linha de montagem de Ford? Precisaremos de manuais de auto-ajuda e psicofármacos direcionados a nos curar do mundo criado por estas ferramentas? Mostre-nos a experiência revolucionária que tem uma garantia completa de ser absolutamente inútil à apropriação capitalista! Nem mesmo o cinismo e a apatia podem pretender isso. A busca continua! A luta continua!

Como novas ferramentas como SMS, IM, Voz sobre IP, Skype, Opinity, Facebook ou MySpace afetam a forma que agimos? As sirenes corporativas tentam os milhões online em direção à rede de seus empreendimentos interativoss. O que podemos aprender disso? Como podemos escapar da verdade cínica de que tudo o que resta a fazer é ou apropriar-se do conhecimento de ontem da classe de consultores ou sermos apropriados nós mesmos? O que a Revolução para Bobos dirá? Irá Che Guevara usar uma camisa de Homer Simpson? O que está em risco em nossa colaboração? Nós somos o outro. Nós somos a classe consultora. A divisão entre branco e preto não nos leva a lugar algum. Nós temos um gerente dentro de nós. É como um alien que queima em nosso peito. Nossa atitude de oposição se torna mais forte a partir desta percepção.

Esperamos que este livro não apenas ofereça a você uma gramática da colaboração. Esperamos estabelecer um dicionário da linguagem da cooperação, um mapa dinâmico do território. Livre Cooperação não foi nossa última palavra. Para continuar lendo este texto, embarque em uma colaboração.

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